"Fui para casa impressionado com a história dos milagres. De noite, na cama continuei pensando no filme, sem conseguir dormir. O que me intrigava era a espécie de milagres que o homem pedia: tudo bobagem, a bengala virar árvore, salvar o mundo, coisas assim. Comigo, seria diferente. Eu haveria de pedir outros milagres. Como por exemplo...
-Apaga essa luz que eu quero dormir.
Era o Toninho. Dormíamos no mesmo quarto. Mais velho do que eu, já estudava no turno da manhã, tinha de acordar cedo. Era assim quase toda a noite: eu gostava de ler antes de dormir, e ele pedidndo que apagasse a luz. O botão ficava perto da minha cama.
E então aconteceu.
A luz se apagou sozinha, quando olhei para ela como fez o homem no filme e experimentei ordenar que ela se apagasse. Não precisei pronunciar uma única palavra: foi só pensar e ela se apagou.
Toninho, virado para o outro lado, não chegou a perceber nada. Certamente achou que eu me levantei e fui até à parede apagar a luz, como fazia sempre.
Fiquei deslumbrado: quer dizer que eu também podia fazer milagres! Para tirar qualquer dúvida, ordenei mentalmente que a luz se acendesse de novo. E ela se acendeu-
-Que brincadeira é essa? - exclamou Toninho,virando-se na cama, os olhois cheios de sono: - Fica acendendo e apagando a luz! Apaga de uma vez!
Para que ele não desconfiasse, tornei a apagar a luz, desta vez por mim mesmo, sem milagre nenhum.
Nem voltei para a cama. De pé, no escuro, mandei que a noite se acabasse e o dia nascesse de uma vez. E vi pela janela o céu começar a clarear rapidamente, o sol subindo no horizonte como um balão."
Sabino, Fernando - 'O Menino no Espelho'
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário